TRF-6 concedeu habeas corpus ao ex-presidente da Vale
A decisão dos desembargadores da 2ª turma do Tribunal Regional Federal da 6ª região (TRF-6) de conceder habeas corpus ao ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, indignou movimentos sociais que representam familiares de vÃtimas do rompimento, no dia 25 de janeiro de 2019, da barragem Mina Córrego do Feijão, na cidade de Brumadinho, Minas Gerais, pertencente à empresa.âà com perplexidade que recebemos a notÃcia da votação sobre o habeas corpus do ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman. à revoltante saber que desembargadores do TRF-6 reconheceram, deram efetividade ao habeas corpus apresentado pelo ex-presidente da Vale, que, sim, era conhecedor de que a barragem era instável, que a barragem não oferecia estabilidade e que não tomou nenhuma atitude e permitiu que 272 pessoas fossem assassinadasâ, disse a presidente da Associação dos familiares de VÃtimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (Avabrum), Andresa Aparecida Rocha Rodrigues, em vÃdeo encaminhado à  Agência Brasil, no qual leu a nota da entidade.
Na tragédia, Andresa perdeu o filho Bruno que, segundo ela, âfoi assassinado junto com 271 jóias [como os familiares tratam os parentes mortos em consequência do rompimento] pela Vale, pela Tüv Süd [empresa alemã contratada pela Vale para avaliar a barragem da Mina Córrego do Feijão] e seus aliadosâ
âVenho, nesse momento, repudiar e demonstrar a nossa insatisfação e tristeza em dar conhecimento aos votos que foram proferidos em favor de Schvartsman, inocentando o mesmo de toda a responsabilidade de conhecimento das instabilidades da barragem. Schvartsman se livra de um processo sem mesmo respondê-lo e faz isso através do habeas corpusâ, destacou.
A presidente da Avabrum acrescentou que os familiares ainda aguardam que sejam encontradas três pessoas ainda não localizadas após o rompimento. âSeguimos ainda aguardando o encontro de três vÃtimas, de três jóias. à esse o parâmetro que nós temosâ, concluiu.
O Instituto Camila e Luiz Taliberti (ICLT), fundado em 2019 em homenagem aos irmãos que perderam a vida com o rompimento, indicou em nota que vai lutar contra a decisão. âNós, que prezamos pela memória dos mortos na tragédia de Brumadinho, não vamos nos calarâ.
A entidade também reforçou que a falta de conhecimento das condições da barragem, justificada no pedido de habeas corpus, não corresponde à realidade. âO ICLT, como parte da sociedade civil organizada, repudia a falta de responsabilização por um desastre que destruiu tantas famÃlias, sob a alegação de falta de conhecimento dos eventos pelo réuâ, observou.
âAcreditamos na Justiça brasileira e no comprometimento das instituições que colaboraram com as investigações e apontaram os indÃcios que resultaram no indiciamento do então presidente da empresa. Em nome da memória de centenas de famÃlias, mães, pais, filhos e amigos dos mortos, pedimos que os desembargadores repensem os seus votos e que o réu seja julgado, respeitando o devido processo legalâ, defendeu o ICLT.
O Instituto, que luta por justiça, para que a tragédia jamais seja esquecida e para que não se repita, como forma de honrar a memória das 272 pessoas mortas, é presidido por Helena Taliberti, mãe dos irmãos. âInspirada no legado de Camila e Luiz, a entidade tem como missão a defesa dos direitos humanos por meio de duas vertentes principais: a proteção do meio ambiente e o empoderamento de grupos em situações de vulnerabilidade, especialmente mulheresâ, informou o ICLT.
MAB
O coordenador nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Joceli Andrioli, disse à  Agência Brasil que a entidade classificou como vergonhosa a decisão dos desembargadores da 2ª Turma do TRF-6 na concessão do habeas corpus, referente ao que chamam de crime cometido pela Vale em Brumadinho.
âIsso é indignante frente a um fato monstruoso que foi o massacre, a morte, o homicÃdio das 272 pessoas. Isso causa e gera um indÃcio de impunidade sobre esse que é um dos maiores crimes socioambientais em massacres humanos no Brasil no último perÃodo. Classificamos de vergonha a posição do judiciário e estamos juntos com as vÃtimas, junto com a Avabrum, reforçando esta luta para que no Brasil a gente possa ter justiça. Um dos fatos da Justiça é condenar, prender, inclusive essas pessoas, pelo crime que cometeram para que novos crimes não venham a ocorrer em nosso paÃs. Vamos cobrar das instituições para que recorram dessa decisão e para que de fato a Justiça seja alcançada no nosso paÃsâ, afirmou.
Decisão
Na decisão, os desembargadores consideraram que o MP não apresentou indÃcios de autoria contra Fábio Schvartsman no caso do rompimento da Barragem de Brumadinho. No entanto, seguem as ações penais relacionadas a outros quinze acusados.
âCabe destacar que essa decisão não se estende aos demais réus das ações penais, cujo trâmite segue normalmente na Justiça Federal de primeiro grau. As ações penais envolvem outros quinze réus, que permanecem respondendo a acusação de crimes de homicÃdio qualificado e de crimes ambientaisâ, informou o TRF-6 em resposta à  Agência Brasil.
Os integrantes da 2ª Turma concordaram com o voto do desembargador Flávio Boson Gambogi, relator do caso, que propôs o trancamento das ações penais exclusivamente em relação ao ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman.
O TRF-6 esclareceu que este julgamento ânão discutiu se o réu é culpado ou inocente, mas analisou se a denúncia foi acompanhada de indÃcios mÃnimos de conduta criminosa”. Os desembargadores entenderam que, até o momento, o Ministério Público não apresentou indÃcios mÃnimos de envolvimento do ex-Presidente da Vale no rompimento da Barragem.
Ainda na decisão, os desembargadores informaram de forma unânime que o Ministério Público poderá oferecer nova denúncia ao ex-presidente da Vale baseada em novas provas, que, até o momento, não estão nos autos.
âNesse momento clamamos ao Ministério Público Federal que ofereça nova denúncia baseada nas inúmeras provas que se tem dentro do inquérito da PolÃcia Federal sobre o conhecimento que o Schvartsman tinha e segue tendo sobre a instabilidade da barragem. Infelizmente essa decisão é uma decisão que ofende o Brasil, que ofende a memória das vÃtimas e nos coloca enquanto familiares prisioneiros porque diante de toda essa aberração, de todo esse crime, os únicos prisioneiros, até o momento, somos nós familiares, que seguimos presos à lama de sangue, à lama de dor e à lama de injustiça que assola as nossas vidas dia após diaâ, diz Andresa Aparecida Rocha Rodrigues.
A expectativa da presidente da Avabrum é de que o MPF apresente a nova denúncia o mais rápido possÃvel. âEsperamos que haja celeridade no Ministério Público Federal em oferecer a denúncia pautada em todo o inquérito da PolÃcia Federal. Se não houver justiça, matar em nome do lucro terá, sim, cada vez mais crescimento no Brasil. 272 pessoas morreram e nada foi feito. Em Mariana, 20 pessoas morreram, nada foi feito. Quem será a próxima vÃtima? Precisamos que a justiça faça seu papel e dê o recado para que matar em nome do lucro cesse, que as fiscalizações de fato aconteçam e que não haja maquiagem. Para que ninguém passe a dor que eu, mãe de um único filho, e mais 271 familiares passamos no dia a diaâ, apontou.
Defesa
Para os advogados Pierpaolo Bottini, MaurÃcio Campos e Paulo Freitas Ribeiro, que defendem o ex-presidente da Vale, a decisão da 2ª Turma do TRF-6 reconhece que não houve omissão do cliente. âA defesa de Fábio Schvartsman ressalta que a decisão do Tribunal Regional Federal da 6ª Região pelo trancamento da ação penal reconhece a inexistência de qualquer ato ou omissão do ex-presidente da Vale que possuam algum nexo causal com o rompimento da barragem de Brumadinho. A defesa sempre confiou no reconhecimento de que Fábio Schvartsman foi diligente no cumprimento de seu dever à frente da companhiaâ, indicaram em nota assinada pelos três.
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