Investigadores ressaltam que os depoimentos de Mauro Cid são apenas parte do conteúdo de provas contra os investigados
Por causa dos áudios divulgados pela Veja na noite de quinta-feira (21), o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), deverá ser ouvido nesta sexta-feira (22) pelo juiz instrutor do gabinete de Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do inquérito que investiga a suposta tentativa de golpe de Estado e que tem o militar como colaborador.
A PF já levanta a possibilidade de anulação do acordo de delação premiada do tenente-coronel. Desde que fechou o acordo, em setembro do ano passado, ele já prestou seis depoimentos.
Advogados de Mauro Cid disseram que os áudios ânão passam de desabafosâ. Para a defesa, as declarações, enviadas a um amigo por meio de Whatsapp, ânão comprometem a lisura, seriedade e correçãoâ da delação firmada pelo militar com a PF, sob respaldo da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do STF.
âOs referidos áudios divulgados pela revista Veja, ao que parecem clandestinos, não passam de um desabafo em que relata o difÃcil momento e a angústia pessoal, familiar e profissional pelos quais está passando, advindos da investigação e dos efeitos que ela produz perante a sociedade, familiares e colegas de fardaâ, dizem os advogados no comunicado.
âMauro César Babosa Cid em nenhum momento coloca em xeque a independência, funcionalidade e honestidade da PolÃcia Federal, da Procuradoria-Geral da República ou do Supremo Tribunal Federal na condução dos inquéritos em que é investigado e colaborador, aliás, seus defensores não subscrevem o conteúdo de seus áudiosâ, prossegue a nota.
Por fim, o texto, assinado por todos os advogados de Cid, reforça que âde forma alguma, comprometem a lisura, seriedade e correção dos termos de sua colaboração premiada firmada perante a autoridade policial, na presença de seus defensores constituÃdos e devidamente homologada pelo Supremo Tribunal Federal nos estritos termos da legalidadeâ.
O âdesabafoâ ocorreu após Cid, Bolsonaro e outras 15 pessoas serem indiciadas no inquérito que apura suposto plano de tentativa de golpe de Estado que visava impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PL) para manter o ex-presidente no poder. A trama incluiria a prisão de Alexandre de Moraes.
Juiz auxiliar deve ouvir Mauro Cid nesta sexta-feira
Investigadores ressaltam que os depoimentos de Cid são apenas parte do conteúdo de provas contra os investigados. No relatório final do caso, apresentando à PGR e ao STF, a PF apresentou uma série de evidências, que corroboram as declarações de Cid e outras testemunhas.
Entre elas estão cópias de trocas de mensagens dos investigados, documentos, arquivos de computadores e de celulares, vÃdeos e comprovantes de entrada e saÃdas dos locais onde os indiciados estiveram para tratar da suposta trama golpista.
Mauro Cid fechou acordo de delação premiada com a PF após ficar preso por 129 dias. Ele foi preso no âmbito da operação que apura a inserção de informações falsas de doses da Covid-19 em cartões de vacinas de familiares dele, de Bolsonaro, da filha do ex-presidente e de dois seguranças.
O tenente-coronel é figura central das investigações que miram Bolsonaro e seus aliados. Mauro Cid fechou acordo de delação premiada com a PF após ficar preso por 129 dias. Ele foi preso no âmbito da operação que apura a inserção de informações falsas de doses da Covid-19 em cartões de vacinas de familiares dele, de Bolsonaro, da filha do ex-presidente e de dois seguranças.
Ao fechar o acordo e se comprometer a dizer a verdade, o colaborador consegue vantagens, como tempo de pena menor caso seja condenado. Além do caso das vacinas, a delação de Cid embasa outras apurações, como a que apura uma trama de golpe de Estado e das joias sauditas que envolvem o ex-presidente e a mulher, Michelle Bolsonaro.
Mauro Cid fala em ânarrativa prontaâ
De acordo com a reportagem da Veja, a gravação em que Mauro Cid ataca a PF e Moraes foi realizada na semana passada, depois que o tenente-coronel prestou depoimento à PF no último dia, e que durou 9 horas.
O militar diz que os inquéritos já possuem ânarrativa prontaâ. Ele afirma que foi pressionado a relatar fatos que não aconteceram e detalhar eventos sobre os quais não tinha conhecimento. âEles (os policiais) queriam que eu falasse coisa que eu não sei, que não aconteceuâ, disse em um primeiro áudio.
âNão adianta. Você pode falar o que quiser. Eles não aceitavam e discutiam. E discutiam que a minha versão não era a verdadeira, que não podia ter sido assim, que eu estava mentindoâ, completou.
âEles estão com a narrativa pronta. Eles não queriam saber a verdade, eles queriam só que eu confirmasse a narrativa deles. Entendeu? à isso que eles queriam. E todas as vezes eles falavam: Ã, a sua colaboração está muito boaâ. Ele (o delegado) até falou: âVacina, por exemplo, você vai ser indiciado por nove negócios de vacina, nove tentativas de falsificação de vacina. Vai ser indiciado por associação criminosa e mais um termo láâ. Ele falou assim: âSó essa brincadeira são trinta anos para vocêâ.â
Mauro Cid diz que a âa lei já acabouâ
Em outro áudio, ele ainda critica Alexandre de Moraes, dando a entender que o ministro, que é relator de diversos casos no Supremo que miram o ex-presidente, quer prender Bolsonaro.
âA lei já acabou há muito tempo. Eles são a lei. O Alexandre de Moraes é a lei. Ele prende, ele solta, quando ele quiser, como ele quiser. Com Ministério Público, sem Ministério Público, com acusação, sem acusaçãoâ, diz.
O tenente-coronel ainda fala para o amigo que a PF tem feito uma filtragem das informações que estão sendo oficializadas na delação. Segundo Cid, encontro entre Moraes e Bolsonaro, não foi registrado nos depoimentos.
âEu falei daquele encontro do Alexandre de Moraes com o presidente, eles ficaram desconcertados, desconcertados. Eu falei: âQuer que eu fale? Eu não vou botar no papel porque senão eu vou me f*****, mas o presidente encontrou secretamente com Alexandre de Moraes”.
As crÃticas contra Moraes continuam, com o Cid dizendo que o ministro do STF âjá tem a sentença dele prontaâ. âAcho que essa é que é a grande verdade. Ele já tem a sentença dele pronta. Só tá esperando passar um tempo. O momento que ele achar conveniente denuncia todo mundo, o PGR acata, aceita e ele prende todo mundoâ.
âBolsonaro ficou milionárioâ e âeu me f****â, diz Mauro Cid
Ainda nos áudios, Mauro Cid fala da situação em que se tornou âtraidorâ e, desde então, tem o nome envolvido em manchetes diariamente. âQuem mais se f**** fui eu. Quem mais perdeu coisa fui eu. Pensa todo mundo aÃ. Ninguém perdeu carreira, ninguém perdeu vida financeira como eu perdi. Todo mundo já era quatro estrelas, já tinha atingido o topo, né?â.
Ele também diz que Bolsonaro ficou milionário com a ajuda de apoiadores. âO presidente teve Pix de milhões, ficou milionário, né? âPara polÃtico é até bom essas p***** porque eles até conseguem se eleger fácil. O único que teve pai, filha, esposa envolvido, o único que perdeu a carreira, o único que perdeu a vida financeira toda fui euâ, desabafou.
Para explicar o motivo que fechou o acordo de delação premiada, o tenente-coronel fala que senão fizesse isso, iria pegar â30, 40 anos de prisão porque eu estou em vacina, eu estou em joiaâ. Ele ainda acredita que as investigações vão continuar avançando e todos que estão de certa forma envolvidos vão ser condenados.
âVai entrar todo mundo em tudo. Vai somar as penas lá, vai dar mais de 100 anos para todo mundo. A cama está toda armada. E vou dizer: os bagrinhos estão pegando 17 anos. Teoricamente, os mais altos vão pegar quantos?â.
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