A entrevista foi publicada pelo UOL nesta segunda-feira (24), um dia antes de Silvio Almeida prestar depoimento na sede da Polícia Federal em Brasília, em inquérito que investiga o caso e está em segredo de Justiça.
Silvio Almeida disse que Anielle Franco, assim como ele, caiu em uma “armadilha” política. O ex-ministro também falou que tudo não passou de “fofoca” e que a ministra se perdeu num personagem.
“Acho que ela caiu numa armadilha, a falta de compreensão de como funciona a política — a armadilha em que eu caí também. Não prestei atenção em coisas em que deveria ter prestado mais atenção. Ela, da mesma forma. Ela se perdeu num personagem”, disse Almeida.
“Para tentar me desgastar, ela participou desse espalhamento de fofocas e intrigas sobre mim. O objetivo talvez fosse minar minha credibilidade, tirar meu espaço em certos círculos da elite carioca, da academia, com pessoas ligadas ao sistema de justiça. Me queimar”, prosseguiu.
“Essa fofoca se tornou objeto de interesse do jornalismo. Isso se tornou um caso de interesse das autoridades policiais. E foi hipotecada uma crise enorme para o governo. Ela perdeu o controle da narrativa. Diante do tamanho da crise, sobraram para ela duas opções”, completou.
Questionado quais eram essas “opções”, Almeida respondeu que “ou ela dizia que não aconteceu; ou dobrava a aposta na história inverídica, destruindo políticas importantes, a minha vida pessoal e a da minha família”. “Ela escolheu o caminho da destruição”, concluiu.
Ex-ministro disse que sequer conviveu com Anielle na transição
Ao ser questionado sobre a acusação de Anielle Franco que, entrevista à revista Veja, disse que a importunação sexual começou nos trabalhos da transição, entre a eleição e posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Silvio Almeida disse que eles nem conviveram nesse período.
Almeida ressaltou que foi poucas vezes ao Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília, onde se reunia a equipe de transição. “Eu tinha uma série de conferências pré-agendadas na Europa e coordenei o trabalho online”, contou.
“Tenho lembrança de ter encontrado Anielle em duas ocasiões. Num jantar, em que minha esposa, grávida, ficou conversando com a ministra. Depois no dia em que fomos anunciados ministros”, afirmou Almeida.
“Não tenho lembrança de ter me encontrado com ela durante os trabalhos. Se aconteceu, foi um encontro rápido nos corredores, ou na saída do Centro Cultural Banco do Brasil, sede da transição, e eu estava com assessores”, completou.
Almeida também negou veementemente ter feito “sussurros eróticos” nos ouvidos da ministra e ter passado a mão nas pernas dela por baixo da mesa em uma reunião em Brasília.
“É óbvio que não. Imagine uma reunião em que estão dois ministros. Eu, sentado, na lateral da mesa; a ministra sentada na ponta, outras pessoas sentadas, o presidente da Anac [Agência Nacional de Aviação Civil], e logo na minha frente o diretor geral da Polícia Federal”, comentou.
O ex-ministro disse que a reunião, que “foi tensa”, tratava de casos de racismo nos aeroportos. E, em determinado momento, ele e Anielle divergiram, até a ministra reagir de forma “deselegante”.
“Surgiu uma divergência entre o que eu propunha e o que a ministra propunha. (…) Entretanto, ela foi extremamente deselegante. Comecei a dar opiniões e, em determinado momento, ela pega meu braço e fala mais ou menos assim: ‘Em todo lugar você quer dar aula. Aqui não é lugar de dar aula’”, relatou Almeida.
“Eu me calei. Tinha outro compromisso e saí da reunião. Minha secretária executiva acompanhou o restante. Depois tive uma conversa com meus assessores sobre como era difícil trabalhar com o Ministério da Igualdade Racial e com a Anielle Franco, como ela foi desrespeitosa comigo. Ela fingia ter comigo uma intimidade que nunca teve, falando comigo daquele jeito”, prosseguiu.
“Achei inadequado e eu dei uma determinação no ministério: ‘Só vamos falar de questões relacionadas à política de igualdade racial dentro dos limites da competência do Ministério dos Direitos Humanos. Não vamos nos meter nas políticas de promoção da igualdade racial’. Isso ainda que eu estivesse sendo chamado a todo momento para participar de eventos e de formulação de políticas que envolvessem igualdade racial. Mas comecei a recusar, para que não houvesse desconforto”, completou.
“Eu não tinha tempo de lidar com fofoca, o que pode ter sido um erro meu”
Silvio Almeida falou que havia muita “fofoca” e intriga no governo, com gente dedicada a vazar informações falsas para imprensa.
“Vieram falar que a ministra se sentia incomodada com o fato de eu ser tido como referência na área atinente ao ministério dela. Só que eram fofocas. Eu não tinha tempo de lidar com fofoca, o que pode ter sido um erro meu. Não tinha entendido que a política é feita de intriga. Tem gente especialista, dentro e fora do governo, em criar intriga e vazar para a imprensa. Tanto eu quanto Anielle Franco fomos enredados nessa imundice”, afirmou.
Questionado sobre a acusação da professora Isabel Rodrigues de que ele a apalpou por baixo da mesa, disse ter ficado “surpreso”, que ambos tiveram “intensa amizade” e sugeriu que ela decidiu fazer tal acusação para alavancar uma candidatura à vereadora em 2022.
“Eu a conheci em 2015, 2016, e desde então travamos uma amizade intensa. Depois fui morar nos Estados Unidos e nos afastamos, mas mantivemos algum contato. De repente, ela aparece candidata [Isabel foi candidata a vereadora em Santo André], se declarando a 15ª vítima, sendo que sequer se sabia qual o número das supostas vítimas. Achei esquisito. E incongruente em relação às atitudes que teve comigo há pouquíssimo tempo”, respondeu Almeida.
Ele contou que Isabel Rodrigues o procurou, pouco antes da denúncia, “querendo conversar”. “Falamos rapidamente sobre a candidatura dela, pouco antes de estourar, e quando isso estoura eu apareço como abusador”, comentou Almeida.
Ele também foi questionado sobre a denúncia de assédio a ex-alunas. Novamente negou qualquer assédio e ressaltou que nunca houve uma acusação nos 20 anos em que esteve lecionando.
“Quando comecei a dar aula, em 2006, 2007, um amigo disse: ‘Você é jovem, é um homem negro, se cerque de cuidados’. Por isso trabalho com assistentes. Pouquíssimas vezes apliquei uma prova. Dou aula há 20 anos. Tive, aproximadamente, 40 mil alunos. Metade disso são mulheres. Em todas as universidades que passei, isso está dito de maneira oficial, nunca tive nenhum tipo de acusação”, afirmou.
Sem decepção com Lula, mas indignado com acusações
O ex-ministro negou ter ficado decepcionado com Lula por causa da demissão. “Ele foi levado a uma situação incontornável. Não tinha alternativa”, afirmou. “Em relação ao respeito que eu eventualmente tinha, nunca me iludi com o status de celebridade”. disse Almeida ao ser perguntado como foi sair da posição de intelectual respeitado, celebridade, para ser chamado de estuprador.
“E estuprador? Nenhuma das supostas denúncias fala a respeito disso. Isso é coisa de gente má, perversa, canalha.Foi uma experiência de muito sofrimento. Primeiro vem a tristeza, depois a indignação. Estou indignado. Todas as pessoas que estão se referindo a mim desse jeito vão ser responsabilizadas”, avisou.
Silvio Almeida alegou que ficou cinco meses em silêncio porque “precisava entender o que estava acontecendo, cuidar da família, da saúde, ser abraçado pelos amigos”. “Também não havia disposição para que eu fosse ouvido. Criou-se um clima de hostilidade. Minha defesa era lida como forma de desrespeito às supostas vítimas”.
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