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Um Presidente sem Povo

Um Presidente sem Povo

(Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do Portal ZUG.)

Lula não convocou para manifestação. Ele já não é um líder carismático popular. Lula detém um poder num arranjo que é baseado muito mais em suas relações de poder entre a elite governante do que no apoio da população nas ruas com as suas bandeiras.

O PT foi às ruas. Finalmente tomou a coragem de convocar uma manifestação, para mostrar a força do partido que venceu as eleições no Brasil. E assim, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, convocou em um vídeo postado nas redes sociais, o povo para estar nas ruas em defesa da democracia, numa manifestação agendada para o dia 23 de março: “Olá pessoal, passando por aqui pra lembrar que agora no sábado, dia 23, é o nosso dia nacional de mobilização em defesa da democracia, golpe nunca mais, sem anistia. Consulte aí na sua cidade onde será o ato. Pegue sua bandeira e vá participar. A defesa da democracia depende de nós, da nossa mobilização e da nossa força. Grande abraço.”

Para quem conhece a esquerda radical, há uma surpresa, deixaram pela primeira vez de misturar governo e partido. O partido fez a convocação, mas o governo não. Assessores muito próximos de Lula da Silva acharam que seria um erro fazer um ato público, porque seria medir forças com a mobilização de Jair Bolsonaro em 25 de fevereiro.

A desculpa que foi para a mídia, uma desculpa quase esfarrapada, que seria muito perto do dia 31 de março e poderia incomodar os líderes militares por causa da proximidade do aniversário do golpe militar de 1964.

A verdade é que a esquerda não tem mais a capacidade de mobilização que ela tinha quando os sindicatos, enriquecidos com imposto sindical, mobilizavam junto com a CUT milhares de pessoas para saírem às ruas com Lula. Desta vez não foi assim, visto que conforme a reportagem do jornal Poder360 mostra que mesmo tendo o governo do estado na Bahia, o PT não conseguiu reunir mais do que 818 pessoas em frente à Fundação Casa de Jorge Amado.

Ora, 818 pessoas é um número ridículo, num lugar onde o PT tem o governo do estado, a prefeitura e apoiadores por toda a parte. Sequer os funcionários mais próximos do governo do PT foram à rua apoiar e fazer voz na manifestação que Gleise convocou, lembrando que Salvador era a principal cidade da convocação e para lá, a presidente do PT e o líder do governo no Senado Jaques Wagner se deslocariam para receber os aplausos da população e dos admiradores petistas. Não foi assim na Bahia.

E não foi assim nem em Belford Roxo no Rio de Janeiro, onde, aliás, o prefeito deu ponto facultativo, mas não era ponto facultativo para ficar em casa, para descansar ou para passar com a família. Era um ponto facultativo muito especial. Era para estar na inauguração de Lula, conforme áudio, disponibilizado na internet, desta diretora de uma escola de Belford Roxo: “Ó fizemos a reunião. Todo mundo sabe que terça-feira é ponto facultativo, mas não é ponto facultativo para gente ficar em casa, o objetivo do ponto facultativo foi porque queremos todos nós na inauguração e tudo, não é ponto facultativo, não foi emendado segunda, porque segunda é normal.  Então, conclusão, todos nós, terça-feira lá. Então o que vai ser feito:  vai ter a rota do Presidente, só que o povo não vai acompanhar tudo porque como vocês sabem a concentração é em frente do batalhão, que está sendo calçado, tudo organizado… e precisamos de todos.”

Nem assim, nem dando folga conseguiram lotar as ruas. Nem na Bahia, nem no Rio de Janeiro, nem em nenhum lugar do Brasil. Aquele Lula, o Lula popular, o Lula que enchia caravanas de sindicalistas para o acompanharem Brasil a fora, parece que não existe mais.

O líder petista testemunha uma queda preocupante em sua força eleitoral em todo o país. Nem mesmo nos piores pesadelos do PT este cenário poderia ser imaginado, especialmente com o amplo apoio que Lula tem recebido da grande imprensa, que tem contribuído para manter sua imagem polida perante parte da sociedade alcançada pelas mídias convencionais.

Até mesmo os mais otimistas no núcleo de Lula estão sendo enfáticos em reuniões internas com lideranças: a rachadura na grande muralha vermelha está ocorrendo em todos os estados brasileiros, sem exceção, ou seja, o plano do PT falhou.

Enfim, a versão Lula da cachacinha no balcão do boteco parece de fato ter desaparecido, transformando no Lula apreciador dos vinhos de milhares de reais em sua adega particular. O Lula que passeia, que viaja mundo afora com dinheiro público, mas não vai na vila popular, olhar a população de frente. O Lula que se queixa e pede mobilização dos movimentos populares, dos movimentos sociais, para arrumarem uma moradia para ele no início do governo, porque ainda não tinham achado os móveis do Palácio e ele era um sem Palácio, conforme suas falas transmitidas pelos meios de comunicação no dia 31 de janeiro de 2023: “Eu deveria estar falando lá no pequeno microfone do meu governo social para reivindicar do companheiro, o Rui Costa, o nosso querido chefe da Casa Civil, a casa para o Presidente da República morar, porque eu ainda não estou morando numa casa. Eu estou morando no hotel. Eu sou eu, na verdade sou sem casa, um sem Palácio. Vocês precisam ajudar a reivindicar o direito de eu morar. Porque já faz mais de 45 dias que eu estou no hotel, que não é brincadeira, é eu, Janja, e 2 ‘cachorra’, quem está dentro do hotel, a espera que a gente consiga liberar o Palácio da Alvorada, porque o cidadão que estava morando lá, me parece que não tinha nenhuma disposição e nenhuma intenção de cuidar daquilo, nem cama, a gente encontrou dentro do Palácio da Alvorada, no quarto, que é o quarto presidencial.”

Este é o novo Lula, o Lula que reclama de hotel 5 estrelas, versos, aquela história do partido dos trabalhadores que nasceu no confronto com o capital para ajudar a classe trabalhadora. Isso é história antiga para o PT.

O novo Lula é o Lula que não tem coragem de convocar o povo às ruas e, ao não fazer, as manifestações mixaram ainda mais.

Prova disso, foi o evento ocorrido no dia 1º de maio, no estacionamento da Neo Química Arena (Arena do Corinthians) em São Paulo, onde o Presidente Lula queixou-se do esvaziamento do ato em comemoração do Dia do Trabalhador. A mobilização foi organizada pelas centrais sindicais, mas o petista reclamou da “falta de convocação” com o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macêdo: “Vocês sabem que ontem eu conversei com ele sobre esse ato, e eu disse pra ele: ‘Márcio, o ato tá mal convocado. O ato tá mal convocado’. Nós não fizemos o esforço necessário para levar a quantidade de gente que era preciso levar. Mas, de qualquer forma, eu tô acostumado a falar com 1.000, com um milhão, mas também se for necessário eu falar apenas com a senhora maravilhosa que tá ali na minha frente pra conversar”, disse ao público. Ao lado de Lula no “1º de Maio Unificado”, o ministro Márcio Macêdo ficou visivelmente desconfortável.

O que Lula não entende ou não quer entender, é que não se trata de um ato mal convocado, mas sim, devido aos seus apoiadores não quererem ir às ruas para prestigiá-lo.

Uma vergonha para quem tem o poder no Brasil. Sim, é verdade. Lula tem o poder e a verdade, também, é que manifestação e protesto são instrumentos basicamente da oposição de quem está fora do poder, de quem almeja o poder, ou, de quem critica o poder como eu estou fazendo agora.

A figura do protesto a favor é uma coisa estranha, como um quadrado redondo. Não parece funcionar. Algumas pessoas lembram de Bolsonaro no 7 de Setembro, quando ele estava no poder e convocou manifestações. Sim, mas não eram só manifestações a favor de Bolsonaro. Elas eram também uma manifestação, contra uma divisão do poder de Bolsonaro. Bolsonaro tinha o governo, mas não tinha todo o poder. Bolsonaro tinha um poder dividido. Ao contrário de Lula que tem um poder indivisível, um poder harmônico. Não independente entre si, mas harmônico com os demais poderes da União. Não era o caso com Bolsonaro. E por isso, Bolsonaro, mesmo estando no governo, convocou as manifestações do 7 de Setembro, que tinham uma carga de reclamação, de contraposição, de levantamento de uma pauta contrária a alguém, ou seja, não era só apoio a Bolsonaro. E aqueles cartazes que eram erguidos, que diziam Supremo é o povo, lembram bem deste momento.

Portanto, grandes manifestações são tipicamente da oposição. Elas podem acontecer quando um líder carismático inflama e atrai para essas manifestações; manifestações a favor podem ocorrer, mas é preciso muita bala na agulha para convocar isso. É preciso muita coragem que Bolsonaro mostrou naquele 7 de Setembro, num misto de apoio popular e contraposição a outros poderes. Lula preferiu não fazê-lo. Ele já não é um líder carismático popular. Lula detém um poder num arranjo que é baseado muito mais em suas relações de poder entre a elite governante do que no apoio da população nas ruas com as suas bandeiras.

A esquerda abandonou a sua velha pauta tradicional de defesa dos trabalhadores e agora aderiu à esquerda woke, à esquerda identitária nascida principalmente nos Estados Unidos, ou seja, um grupo de pessoas que tendem a ser identitárias, censuradoras ou puritanas em seu pensamento ou um “guerreiro cultural que não consegue aceitar o fato de que existem pessoas no mundo que discordam dele”. Isso enfraquece ainda mais a figura de Lula da Silva, que continua tropeçando nas palavras e não consegue comprar completamente o discurso identitário.

Esta é a nova natureza do governo do PT, um governo que não consegue mobilizar, que nem os funcionários mais próximos e nomeados pelos seus governos saem às ruas em sua defesa. É manifestação pela democracia? Parece que os aliados de Lula não vêem uma ameaça tão grande à democracia da forma como eles a entendem, não viram necessidade de sair às ruas para defender uma democracia. Talvez porque Lula tem mesmo esse poder indivisível, este poder pleno e mar calmo com a sua relação com o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional, participando de encontros, como num jantar na noite da segunda-feira(15/04), na residência do ministro Gilmar Mendes, onde estiveram presentes os ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin, bem como o ministro da Justiça e Segurança Pública Lewandowski e o Advogado-Geral da União Jorge Messias, conforme divulgado pela Folha de São Paulo. No jantar, ministros da Suprema Corte solicitaram o apoio do Chefe do Executivo, diante de propostas no Congresso que confrontam o STF. Na conversa, discutiram também as declarações do dono do Twitter/X, Elon Musk, em relação a Alexandre de Moraes. Ou seja, uma reunião de compadres para decidir os rumos da política no país.

A continuar assim, o PT logo vai perder de vez a mão da sua relação com o povo brasileiro. A população mais pobre espera políticas públicas do governo, algo que ainda não acontece. Lula comanda o seu governo olhando pelo retrovisor. Todo o noticiário nacional é sobre Jair Bolsonaro e não sobre medidas do governo de Lula da Silva. Lula aparece menos no jornal do que Bolsonaro e vai se distanciando cada vez mais da sua base.

Não vai demorar para que o povo veja cada vez mais em Lula uma figura estranha. O apoio de Lula da Silva vai minguando cada vez mais. E, se continuar assim caros leitores, chegará ao tempo em que o PT terá uma nova oportunidade de reunir pessoas nas ruas, porque logo estará de novo na oposição, que é o seu lugar.

                                                                                                                         Por Alexandre Magno

Confira a matéria completa em: zug.net.br

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